sábado, 6 de março de 2010

O PELEIADOR PERFUNCTÓRIO

"Conspícuo diretor: abroquelado em extrema necessidade, epigrafando em direito irremoví-vel na ritualidade e sem quiprocó do pergami-nho autorizativo, solicito liberação do título cheque, supedâneo da documentação anexa". O texto acima é de Aristóteles Ferreira, ex-assessor jurídico da Prefeitura de Jaboatão dos Guararapes (PE), em ofício ao secretário das Finanças do dito município.
O que deseja o indigitado assessor, nem madame Natasha o sabe. Madame Natasha, para os mais desinformados, é personagem criado por Elio Gaspari, jornalista de renome nas grandes publicações nacionais brasileiras.
Segundo Gaspari, Madame Natasha é professora de Música, mas odeia piano e instrumentos musicais no geral. Prefere corrigir e tentar recuperar os assassinos do vernáculo, aqueles que tornam uma tortura ler a língua de Camões, a última flor do Lácio, inculta e bela.
Tenho um amigo que costuma dizer que, quando um aparelho ou equipamento qualquer está obsoleto que o produto está "obsolento". Ele, o amigo, não o equipamento, adora falar do modo que os analfabetos por demérito próprio costumam chamar de "difícil". Tanto que ao descrever um tumulto qualquer, diz que a coisa estava um "pãodemônio" e não um pandemônio e que seu trabalho é cavar poços "artesanais" e não poços artesianos.
Mas, como desgraça pouca é bobagem e navio afundado, bem carregado - e no largo - como complementariam caboclos amazônidas com seu falar próprio, eis que me cai às mãos uma preciosidade. Nem mesmo Madame Natasha, em seus sonhos mais delirantes já deparou com texto desse quilate. Trata-se de Ação de Despejo por falta de pagamento, cumulada com a cobrança de alugueres e encargos. Juro por todos os juros que o "alugueres" não é meu. É deles. Ou são. A esta altura do campeonato, tal qual Sócrates, só posso dizer que tudo o que sei, é que não sei absolutamente nada.
Mas, vamos ao texto de um advogado, que fala do encontro do requerente com a requerida: - "Procurada a requerida para explicar o fato, não foi bem recebido o requerente, sendo, inclusive, menoscabado, minguou o colóquio, dizendo ser tudo um peleiador sem pundonor e perfunctório e que era espurcícia e espurco. A requerente, panfletária, esborrou esputo, deixando o requerente azoado e azoretado, quando a requerida se portou aética, sem azo, tentando açodar a explicação, comparando o requerente a um catatuá, a requerida foi desbragada e depautéria, nem esboçou póstero colóquio, tergiversou, turbou a tentativa de acordo, mostrando-se tureba quando o tratou como um rebotalho" (sic).
Volto ao final de uma crônica de minha lavra, di-gamos assim, há tempos publicada, onde citava o humorista José Vasconcelos, quando discursava para ironizar os nossos "preciosistas" que adoram falar "difícil" dizendo: "Não me entenderão os que, assobrejéticos e camaleosos, vierem latinar as conjetivas abserviáceas, para conspurcar a crisoscelácea dos aracnídeos".
Aqui pra nós, bem que o tal advogado poderia usar este final glorioso para o seu não menos glorioso amontoado de asnices raras vezes vistas, tanto no mundo das leis, como no mundo das letras.