quarta-feira, 16 de março de 2011

Muitas vezes, sem maior inspiração para escrever algo melhor, entro em delírio. Afinal de contas, preciso ocupar este espaço todo santo dia. Nessas horas, embarco numa nave intergalática que me leva para o planeta do surrealimso mais desvairado, onde tudo é possível. Até mesmo o que se segue:



A VAIA
A multidão, silenciosa, ouvia o deputado. Em dado momento, o puxa-saco, entusiasmado, bateu solitárias palmas. E o silêncio, revoltado, o vaiou ensurdecedoramente.

UMA CRUZ TRISTE DEMAIS
Lá estava o corpo estendido no chão. Ao lado, carpinteiros rústicos trabalhavam uma cruz, ela, rústica também. Depois, conscienciosamente, pregaram o corpo na cruz e a ergueram. Ao fundo, nuvens plúmbeas e negras colidiam indignadas, cheias da cólera divina, provocando comoção cósmica. Enquanto isso, a cruz de madeira, entristecida, derramava lágrimas de sangue, enquanto maldizia o lenhador que a abatera, para submetê-la a tão triste e indigno destino.


INCONGRUÊNCIA SEM FIM
Como é possível a um planeta tão bonito, tão azul, tão verde, tão dourado e tão rico, abrir-se para recolher em seu ventre, cadáveres que o poluirão, conspurcarão e depois o adubarão, para que mais vida nasça, para ao morrer, voltar àquele útero fétido, onde tudo começará novamente.

PREVIDENTE GRAVIDEZ
Entardece. Os últimos raios de sol tentam agarrar-se desesperadamente à Terra. Mas tudo é inútil. A noite implacável avança, cobrindo o mundo com seu negror absoluto. Mas, não se sabe se porque previdente ou porque o instinto materno fala mais alto, engravida do Sol um último raio luminoso. Para que possa parir o amanhecer de um novo dia.

INCOMPREENSÃO
A boneca olha a menina que lhe faz declarações de amor. Diz ser sua mamãe. Que mãe estranha essa, que se movimenta tanto, que não sabe que bonecas gostam mesmo é de silêncio, de imobilidade, de olhos vítreos que nada vêem e que têm naquela espécie de morte, a sua única razão de existir.


COMO SE ARANHA FOSSE
A aranha arranha o jarro. Não que queira arranhá-lo. O que quer, é sair daquela prisão de vidro translúcido.
Mas o jarro, se está prenhe de aranha, é porque aranha é. E para proteger a aranha que arranha seu útero, tece, laboriosamente, finas teias de vidro sobre a boca, para que ninguém ameace seu filhote, que lentamente vai cessando de arranhá-lo.