quinta-feira, 2 de setembro de 2010

QUANDO A JUSTIÇA BEBE

Havia outrora, provavelmente situado muito além das brumas de Avalon, um país que atendia pelo pitoresco nome de Mamolândia. Era um país abençoado pelos deuses e bonito por natureza, conforme cantavam os menestréis e trovadores da época.

Seus vales verdejantes, suas florestas riquíssima, suas montanhas fartas de minérios, seus rios piscosos e seu povo pacífico, mostravam bem do agrado e de quanto os deuses olhavam com bons olhos, essa terra onde o leite e o mel jorravam com abundância.
Mamolândia tinha dois ícones sagrados: um, a Justiça, que era representada por u’a mulher negra, com os olhos abertos e as mãos estendidas. Uma distribuía a justiça tão necessária na terra dos homens. A outra distribuía bênçãos ao seu povo querido.
O outro ícone adorado pelos felizes habitantes de Mamolândia, era a Grande Vaca Sagrada. Possuía saúde de vaca holandesa premiada em exposição. Tetas opulentas esguichavam leite tipo “A”, distribuído a cântaros aos “mamolandenses”. A Grande Vaca Sagrada, que dera origem ao interessante nome daquele país distante, tal qual a loba que alimentara Rômulo e Remo, alimentava seu povo com o leite sagrado, fazendo-o forte, varonil e justo.
Eis porém que um dia, a serpente - sempre ela -, cheia de inveja, travestida de Baco, visitou a Justiça. E tanto falou das virtudes do vinho que esta, seduzida, bebeu. E em bebendo, embriagou-se. Embriagou-se de álcool, de arrogância, de vaidade, de empáfia, de poder pôr e dispor ao seu bel prazer.
E em mudando a Justiça, mudou também a Grande Vaca Sagrada, que passou a selecionar os que podiam ou não mamar-lhe as generosas tetas. A consequência, previsível, foi que os fracos, foram ficando cada vez mais fracos e os fortes cada vez mais fortes.
Foram criadas então, as duas grandes castas que ainda subsistem naquela hoje indigente terra: os grandes mamadores e os ou-tros. Estes atendem pelo nome de povo, que, como vingança, a última que lhe restava, passou a chamar o outrora ícone sagrado, pelo depreciativo nome de governo.
A Justiça ainda existe, também. Só que mudou de cor - tornou-se branca. Possivelmente de vergonha. Pobre Mamolândia, a que era feliz e não sabia.
Soube-se muito tempo depois da tragédia consumada que a serpente era também co-nhecida no seu mais íntimo círculo de amigos, pelo curioso nome de política.
Estas são as trágicas consequências que ocorrem, quando a Justiça bebe.