Em
Milão, num dia qualquer de agosto de 386 da era cristã, um homem de 32 anos de
idade chorava nos jardins de sua residência. Deprimido e angustiado, estava à
procura de uma resposta definitiva que lhe desse sentido para a vida. Nesse
momento, ouviu uma voz de criança a cantar como se fosse um refrão: “Toma e lê,
toma e lê”. Levantou-se bruscamente, conteve a torrente de lágrimas, olhou em
torno para descobrir de onde vinha o canto, mas não viu mais do que um livro
sobre uma pequena mesa. Abriu e leu a página caída por acaso sob seus olhos:
“Não caminheis em glutonarias e embriaguez, não nos prazeres impuros do leito e
em leviandades, não em contendas e emulações, mas revesti-vos de Nosso Senhor
Jesus Cristo e não cuideis da carne com demasiados desejos”.
Foi
assim que ocorreu a conversão ao catolicismo, pelas palavras de Paulo de Tarso,
de Aurelius Augustinus, nascido em Tagaste, na província romana da Numídia, na
África, posteriormente conhecido apenas como Santo Agostinho, um dos maiores
doutores que a Igreja já possuiu em todos os tempos.
Quem
nos conta que assim foi, é José Américo Motta Pessanha, no Prefácio das
“Confissões”, obra absolutamente indispensável, independentemente da religião
professada pelo leitor.
Lembrei dessa passagem da vida de Agostinho, por causa da nossa pobreza
mental e intelectual. Como pretendemos ser um povo evoluído, se somos um povo
que não lê - e o que é pior: não gosta de ler?
Quem
não lê, é um deficiente intelectual. Jamais um bom profissional, porque lhe
faltará melhor visão e compreensão do mundo, indispensável para que se aprimore
no trabalho que escolheu.
Somos um país de analfabetos. Pior que isso. Somos um país repleto de
autodidatas do analfabetismo. Analfabetos por conta própria, analfabetos com
diploma. Muitas vezes pós-graduados e cheios de empáfia, mas totalmente vazios
do verdadeiro conhecimento.
Nosso povo não tem dinheiro para comprar livros e jornais, dizem os
defensores dos preguiçosos mentais. Na realidade, isto é apenas meia-verdade, o
que quer que isso signifique. A verdade ou é ou não é. Meia, jamais.
Temos dinheiro para beber, para comprar
carros, ir a festas, comprar presentes, penduricalhos doirados e badulaques.
Mas não temos dinheiro para comprar um reles jornal.
Toma
e lê, ouviu Santo Agostinho. A frase, deveríamos ouvi-la nós todos. Se é que
queremos, de verdade, chegar ao que se convencionou chamar de Primeiro-Mundo.
Antes, porém, que se viva no país dos sonhos, temos que fazer uma
revolução em nossos hábitos culturais. Precisamos voltar às origens, quando
cultura implicava uma série de atividades ligadas à música, à pintura, à
escultura e outras artes. Mas implicava, principalmente, no saudável hábito de
ler.
Tomemos pois o que nos cair às mãos e leiamos. Nossos valores, com
certeza mudarão. Quem sabe aprenderemos até o que significa a palavra ética,
que nestes tempos de analfabetismo explícito, desapareceu do dicionário dos
nossos usos e costumes.