quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

O FILHO BANDIDO

Era um homem pobre. Pobre, mas honesto, é bom que se diga. E o esclarecimento vai por conta daqueles que pensam que ser pobre é ser desonesto. Aliás, a coisa é pior quando o pobre é preto. No Brasil, ser preto e pobre é praticamente uma condenação social. Muito embora os habitantes do topo da pirâmide social, continuem afirmando que não há preconceito no país das Pindoramas, a grande e triste verdade é que, o preconceito é uma das marcas mais fortes do gênero humano. E o brasileiro não é exceção, muito pelo contrário.

A rigor, todos temos o nosso preconceitozinho particular. O católico acredita piamente que é me-lhor que os protestantes. Estes, subdivididos em dezenas de seitas, acreditam mais piamente ainda, que a sua seita é a que levará o homem ao altar da salvação eterna. Os espíritas não são diferentes, e muito menos os muçulmanos, quer sejam sunitas ou xiitas. Os judeus, ortodoxos, ultra-ortodoxos ou sefarditas; os budistas, hindus, e todos os integrantes das milhares de religiões e seitas mundo a fora e adentro, cada um acredita que a sua, é que é a verdadeira e seu deus, o mais misericordioso que há. Todas, é claro, interessadíssimas, em maior ou menor grau, no rico ou pobre dinheiro que os fiéis arrecadam à custa de muito suor, e às vezes, sangue e lágrimas.
Mas, voltando ao início desta crônica, que não pretende ser análise sociológica do preconceito social ou racial, o homem era pobre e honesto. Mais que isso: também era pai.
No Dia dos Pais, aquele homem estava mais triste ainda que o normal. E o motivo da sua tristeza era o filho. O filho do homem pobre era um bandido da pior qualidade. Por causa dele, milhares de criancinhas morriam de fome; mulheres davam à luz a filhos subnutridos, decorrência natural da miséria em que viviam, por causa daquele bandido cruel. Homens, aos milhares, perdiam seus empregos, e o horizonte era o mais triste possível, porque não havia espe-ranças para aquelas pessoas atingidas pela maldade daquele marginal, daquele bandido, daquela criatura que tinha vindo ao mundo apenas para provocar dor e sofrimento.
O repórter, entrevistando o homem pobre, ho-nesto e pai daquele monstro, perguntou o que sentia pelo filho que gerara, autor de tantos e ino-mináveis crimes.
E o homem humilde, olhos voltados para o chão, uma lágrima triste e silenciosa escorrendo pelo rosto marcado pelas desilusões da vida, respondeu: - ‘Tá certo que ele é um criminoso. Tenho muita pena dele. Mas se Cristo perdoou Judas, por que não posso perdoar o meu filho? Afinal de contas, pai é pra essas coisas, também.
O repórter agradeceu e saiu para a entrevista com o filho-bandido daquele pai desolado, com quem acabara de descobrir que o amor está acima de todas as coisas, boas ou más. Entrou na sede do Poder, e olhando para o homem engravatado que tinha à sua frente, cercado de assessores, cada um com ar de quem tinha alguma real importância, disse: - Bom dia, Excelência. Vamos começar nossa entrevista?