Servem, também, para desabrigar os que moram em morros ou baixadas, naquela zona fronteiriça entre a pobreza e a miséria causada pela incompetência governamental ampla, geral e irrestrita.
Mas, ao se espalharem, cidade adentro ou cidade abaixo, as águas de março levam consigo as bactérias, os fungos, os vírus, os bacilos, as larvas de todos os mosquitos passíveis de causarem dano ao homem. Levam a disenteria, a malária, a dengue, a leshimaniose, a leptospirose e todas as formas que os deuses da chuva encontraram para dizimar a humanidade com a maior carga de sofrimento possível.
Mas, apesar de servirem para tanta coisa, as águas de março não têm o poder de invadir os palácios e palacetes da burguesia e da classe dominante. Não afeta um micronésimo os carros de luxo nos quais os poderosos deslizam como se em nuvens vivessem.
As águas de março servem para quase tudo. Mas não servem para limpar as cidades. Pelo contrário, as enlameiam, emporcalham e esburacam os leitos das ruas.
Mas, ainda que servissem para limpar toda a sujeira do mundo, mesmo assim não serviriam para lavar a sujeira que tisna, mas não envergonha, a cara dos que têm a obrigação de tornar o lugar em que vivemos, pelo menos habitável.
As águas de março não servem, também, para afogar os ratos, catitas e ratazanas que infestam os gabinetes oficiais. Não servem para levar de enxurrada os corruptos de todos os naipes ideológicos ou mercadológicos; não servem, para dizimar os que fazem do Erário propriedade particular; não funcionam como o Dilúvio através do qual o Todo-Poderoso descarregou a Sua ira, limpando a sujeira moral que cobria o mundo de então.
Ó águas de março, porque serves para tanto e, simultaneamente, não serves para nada?
Ó angústia das angústias, onde estavas líquido de vida e morte,quando o Espírito de D’us deslizava sobre a superfície das águas, ao tempo em que a escuridão ainda envolvia o Universo e aquele Espírito solitário sofria, prenhe de toda a umidade que há, sem saber o que fazer contigo que só surgirias tanto tempo depois?