quinta-feira, 25 de março de 2010

OS VIRA LATAS DO BRASIL

Há alguns anos, a Secretaria de Saúde, através do seu Departamento de Zoonoses, realizou o primeiro censo canino do Amapá. A ideia foi boa. Mas, como não poderia deixar de ser, ousei discordar dos números. A previsão era que existissem, cerca de 33 mil cães, em Macapá. Se a Secretaria estivesse apenas se referindo aos canídeos, poderia até ter concordado.
Do censo, participaram cães de luxo, cães de caça, cães de caça e tiro, cães guias. Com certeza, não faltaram os importantíssimos cães de guarda e de companhia. Dificilmente foi cadastrado algum cão d'água, apesar dos alagamentos que já nos são familiares nas épocas invernosas.
A palavra cão tem origem latina. E nobre, pasmem. Vem de canis e até a Idade Média contrapunha-se, na Espanha, a perro, termo pejorativo e popular. Catulus, era a forma latina para cachorrinho, cãozinho, com o devido perdão do grande Catulo da Paixão Cearense.
É claro que o censo canino encontrou galgos, bassês, beagles, terriers, pastores. É possível que tenha encontrado algum setter irlandês, um cocker spaniel e quem sabe, algum pointer inglês. Filas brasileiros, com certeza se contaram às dezenas. Dobermans, também. A crescente criminalidade e violência assim o exigem.
Não foram encontrados cães esquimós. Seria demasiada crueldade. O dog alemão não faltou, claro. Mas faltaram os São Bernardos. Seriam úteis entre nós. Muitos dos nossos "papudinhos" adorariam ter um cão que fosse até o bar da esquina e retornasse com uma generosa dose de cachaça. Daquela que matou o guarda.
Mas a minha discordância quanto ao número de cães ou de cachorros, como preferirem, prende-se à existência de outros tipos de canídeos. Canídeos de duas patas, esclareça-se.
Quantos serão os vira-latas da política, indago? E os mastins das corporações policiais? Quantos serão os lobos do empresariado e as hienas do banditismo que campeia solto entre nós? E os chacais sem escrúpulos da administração? Quantos serão? Não esqueçamos que lobos, hienas e chacais, tem a mesma ancestralidade. Convém não esquecer os cachorros de madames. Claro que não estou me referindo aos chichuhaua, os malteses, pequineses e os lulus da Pomerânia. Temos também o cachorro sem-vergonha. Atende pelo nome de marido, aquele que cometeu o crime supremo de divertir-se sem a companhia da matrona. Matronas, como se sabe, são gordas. Gordas e infelizes. Pior, gordas e com bigodes. Não existem matronas sem bigodes, daí a neces-sidade do pobre diabo encher solenemente a cara, na tentativa de esquecer que ela, a gorda, espera por ele no lar, doce lar.
Mas, senhores do censo canino, tende piedade dos vira-latas, os legítimos. São a cara do Brasil. Não têm lar, não têm casa, não tem carinho. Canino ou humano. Nunca ninguém os afagou e olhou nos seus olhos sequiosos de amor. De seu, só têm a lata de lixo alheia.
Por isso, e porque o único amor verdadeiro que um ser humano pode ter é o amor de um cão, do seu cão, tende piedade dos vira-latas do Brasil. As almas de milhões de cachorrinhos que já viajaram para os sagrados campos de caça da eternidade, com certeza brilharão de agradecimento. E um coração humano, que uma vez recebeu todo o amor que há, através do olhar de um cachorro que tinha nome e sobrenome, agradece também.

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