quinta-feira, 15 de abril de 2010

PEQUENOS TEXTOS

Amanheci cansado. Se pudesse, teria dormido o dia todo. Acho que estou sendo vítima de um ataque de preguiça explícita. Por causa disso, consultei meus alfarrábios e descobri pequenos textos produzidos por minha mente pseudo surrealista e, às vezes, pretensamente poética. A eles, portanto.

1 - Como se aranha fosse 
A aranha arranha o jarro. Não que queira arranhá-lo. O que quer, é sair daquela prisão de vidro translúcido. Mas o jarro, se está prenhe de aranha, é porque aranha é. E para proteger a ara-nha que arranha seu útero, tece, laboriosamente, finas teias de vidro sobre a boca, para que ninguém ameace seu filhote, que lentamente vai cessando de arranhá-lo.

2 - Papéis Invertidos        
Era um homem de hábitos simples. Acordar, pegar o ônibus, sentar na escrivaninha e traba-lhar o dia inteiro. Essa, a sua rotina diária.
À noite, voltava para casa, jantava, dava boa noite à esposa, e sentava no sofá, para assistir televisão até a hora do sono inevitável.
Foi por isso que ninguém entendeu seu desaparecimento. Não sabiam que, na noite anterior, a apresentadora do seu telejornal preferido, ao encerrar o programa deu boa noite, e cansada de vê-lo sempre ali, noite após noite, sentado, imóvel em frente a ela, desligou-o da vida.

3 - Coisas de cidade grande            
Às vezes pensava não ser de lá. Um alienígena, quem sabe, sem consciência própria do que era. Talvez por isso, não compreendesse bem tudo o que via. Mas, na verdade, era um lugar muito estranho aquele. Lá, tudo parecia pouco nítido, fora de foco ou invertido. Por isso não estranhou, quando viu o devorador de alimento chegar, colocando fumaça pelo cano de descarga. E o monstro, talvez porque sofresse de incontrolável fome, engoliu o alimento pela sua parte dianteira, para, após retirar só o que interessava à sua própria manutenção, vomitar mais adiante o que não mais lhe interessava. E porque era noite, não pude ver os outros alimentos, que mais à frente, esperavam quietos, o momento de entrar no ônibus.

4 - O gol
O silêncio no campo era total. Não se ouvia o zumbir de um inseto. O juiz marcara penâlti. O jogo era decisivo e a torcida quase agonizava de tanta tensão. O apito soa. O chute é disparado e o corpo do jogador descreve um suave arco, enquanto entra, fazendo com que milhares gritem seu grito orgásmico. É gol. No campo, as bolas comemoram, enquanto das arquibancadas, cabeças rolam, e invadem o campo, para a confraternização na vitória da bola sobre o homem.

Um comentário:

  1. como cronista, carlos bezerra é o nosso mário quintana das crônicas!! esses "tiltes" é que nos motiva a ver a vida com mais detalhes e observar nos traços deste cronista como vale apena sentir a vida.

    brito

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