sexta-feira, 30 de março de 2012

O HOMEM QUE FALAVA COM PÁSSAROS

Olhou espantado para o pássaro que falava com ele. Estranhou por duas razões óbvias. A primeira, é que passara a vida aprendendo que pássaros não falam. A segunda, é que aquele estranho pássaro chegara, no exato momento em que dissera que viria. Sim, aquele era o seu segundo encontro com aquele estranho ser voador. Quando o vira pela primeira vez, era muito novo. Tão novo que nem se apercebera do que tinha ocorrido. Só agora lembrava tudo com espantosa nitidez. Entre o primeiro e o segundo encontro, muito tempo passara e coisas estranhas haviam ocorrido. Uma delas, era a incapacidade dos homens para chegarem até ele na hora certa. Jamais começou uma reunião na hora estabelecida; jamais seu avião decolou na hora programada; jamais conseguiu fa-zer qualquer coisa, por pequena que fosse, na hora e no tempo exatos. E foi isso que o perdeu. Ariadne, a que tece o destino dos homens, uniu todos os fios que o levariam à sua razão de viver. E assim, fio por fio, ponto por ponto, foi tecendo a vida daquele homem diferente de todos os homens que até então existiram. Mas, Ariadne tinha um inimigo feroz. Chronos, o dono das dobras do tempo, trabalhava contra ela. E trabalhando contra ela, fez do homem atormentado pela falta de tempo dos outros homens, a sua vítima fatal. A razão de viver do homem que falava com pássaros, foi criada quando o universo era apenas matéria disforme. Foi nela que o Criador de tudo o que há se inspirou, para fazer a sua obra-prima: a mulher. As belas mulheres cortariam os pulsos se a vissem em toda a sua plenitude. A nudez não é coisa do mundo dos homens. É coisa dos seres celestes, dos seres divinos. E quem não viu a musa do Criador em toda a sua esplendorosa nudez, não sabe o que é belo. Pobres e belas mulheres brancas. Não saberão jamais, que a beleza maior foi tirada do mundo negro que dominava o espaço, quando a luz ainda não existia. Por isso, talvez, ainda hoje, as belas mulheres negras consigam anular toda a brancura que há na pele das mulheres alvacentas. O homem que falava com pássaros não a viu jamais. Mas, por estranha indução, imaginou-a, e sem saber que era um estranho na terra dos homens, viu na sua imaginação como era, e a amou para sempre. Não sabia então que, vítima involuntária de Chronos, chegaria tarde para o encontro que era a causa da sua existência. Por isso, quando o pássaro que falava, disse-lhe que era chegada a hora de irem, pois a senhora da vida pedia-lhe a sua, derramou uma solitária lágrima recheada de amor. E pela primeira vez, sem que tivesse marcado o encontro, chegara na hora certa, para andar no caminho sem volta da morte cruel. Não soube jamais, que assim que partiu, ela chegou. Chegou para completá-lo, para fazer dele um ser por inteiro, para gerar uma nova raça de seres, num mundo onde o tempo não existe. Mas, pela primeira vez, partira na hora certa, deixando para trás, tantas possibilidades que não se realizariam jamais.

Um comentário:

  1. Foi uma honra imensa ter tido a oportunidade de cuidar de você querido Sr. Carlos, durante estes longos dias! Sabemos agora que existem pessoas que chegam só para acrescentar em nossos dias uma presença essencial e unica que ficará sempre em nossas mais lindas lembranças, pois nos encantava escutando suas crônicas e poemas lidos e interpretados com tanto amor por tudo o que ele era e acreditava, por isso sempre serão especiais!! Um grande beijo no coração da família que ele tanto amava! Com carinho Leticia França- Hemodialise/ Santa Casa Porto Alegre

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