sábado, 24 de outubro de 2009

Falando de música

"A música é o bálsamo mais eficaz para acalmar, alegrar e vivificar o coração daquele que está triste, daquele que sofre. A música torna os homens mais doces, mais benévolos, mais modestos e mais sensatos. Os que sabem cantar, não se entregam nem à tristeza nem ao desgosto. Eles são alegres e afastam a preocupação com o auxílio de suas canções”.
O pensamento acima, que não é meu, mas sim do ainda pouco conhecido Martinho Lutero, retrata fielmente o valor da música sobre o espírito humano. Às vezes, penso que o Apocalipse ocorrerá sob a música grandiosa de Wagner. Quem sabe, o crepúsculo dos deuses não seria a trilha sonora mais adequada para o filme do final dos tempos? Cristo no Monte das Oliveiras é ópera de Ludwig van Beethoven. E também um dos mais amargos momentos vividos pelo homem Jesus. Foi lá que se entristeceu e se angustiou com o próprio fim. Sabia o que viria. Um frio mortal talvez o tenha deixado arrepiado de temor. Quem sabe, por um momento, tenha ficado lívido ante a tortura que em forma de cruz o guardava mais adiante? Talvez tenha deixado tombar uma lágrima solitária. Tinha que ser forte. Mais forte que todos, porque sabia que os deuses não choram.
Mesmo assim, caiu por terra dizendo: “Minha alma está numa tristeza de morte. Meu Pai, se possível, afasta de mim este cálice. Todavia não seja como Eu quero, mas como Tu queres”. E não teve por perto quem cantasse para aliviar seu pranto. Não teve quem tocasse melodia suave para acompanhar seu canto. Seu canto de morte, anunciando o encontro com aquela que tornaria pó seu lado humano, mas que transformaria em Sol luminoso, seu lado divino. Carregaremos para sempre, a culpa de não termos tido, entre bilhões de homens, um só que cantasse para Jesus, para aliviar tanto sofrimento.
São João Crisóstomo dizia que “nosso canto não é senão um eco, uma imitação do canto dos anjos”. Joan Baez disse certa ocasião que “cantar é amar e afirmar, voar e planar, deslizar para dentro do coração das pessoas que ouvem, contar a eles que a vida é para ser vivida, que o amor está aí, que nada é promessa, que a beleza existe e deve ser procurada e encontrada”. Contou-me Pedro, o que antes era Simão, em sonho sonhado antes do começo de tudo, que sua função como chaveiro do Céu é apenas a parte visível do seu trabalho. Não consegue, até hoje, esquecer aquela noite terrível, quando chamado por Jesus, acompanhou-o até o Getsêmani, lugar onde o Filho do Homem pediu ao Pai que o livrasse dasprovações que O esperavam. Sua função era vigiar enquanto aguardava o Senhor dos Homens. Mas, vencido pelo cansaço, dormiu. Quando acordou, Jesus já havia partido para o encontro com Judas. Por isso, porque não vigiou, porque dormindo, não cantou cantigas que amenizassem o peso da angústia que torturava o Sem-pecados, penitencia-se todas as noites, balançando a rede divina atada entre duas estrelas, onde dorme o menino Jesus. E então, canta baixinho, cantigas de ninar. E enquanto canta, pensa, redimindo seu erro – Dorme em paz Jesus, que eu velarei e cantarei por ti. É por isso, dizem, que em manhãs radiosas o Sol surge mais glorioso que nunca. É sinal que Jesus dormiu em paz. E dormiu em paz porque Pedro, inspirado, cantou como nunca ninguém cantou antes. E nem cantará depois.

Nenhum comentário:

Postar um comentário